No ramo laboratorial, existe uma crescente preocupação com a falta de valores éticos da empresa, decorrente, muitas vezes, da concorrência desleal que busca a maximização do lucro. Quando a rentabilidade passa a ser o objetivo principal do laboratório, a função de assistência à saúde e à população fica em segundo plano, dificultando, assim, a permanência dos laboratórios no mercado.
A resolução nº 596 do Conselho Federal de Farmácia (CFF), assinada em 25 de março de 2014, reformula os códigos de ética da profissão farmacêutica e condena, no seu artigo 8º, a sobreposição da promoção, prevenção e recuperação da saúde e das atividades com fins meramente comerciais. Nesse contexto, busca-se preservar os valores humanos a fim de inibir determinadas atitudes que não compactuam com a conduta organizacional.
Na pauta de hoje, buscamos esclarecer ações que contribuem para o cenário antiético no mercado de análises clínicas.
Ações que prejudicam o mercado de análises clínicas
Para debater sobre o assunto em questão, concentramos, em nossa análise, três grandes grupos: a política de preço predatório, a gestão desonesta e a despreocupação com a qualidade do laboratório.
Política de preço predatório
Visando garantir o preço mínimo a ser praticado no mercado, a tabela SUS é a base da negociação de muitos contratos do laboratório. Sem reajuste oficial desde a implantação do Plano Real, em 1994, os preços baixos assustam o setor; mas não tanto quanto os laboratórios que praticam valores inferiores aos da tabela, especialmente em licitações, oferecendo descontos percentuais sobre esse custo.
Somam-se aos preços abaixo da tabela SUS, os casos em que o laboratório oferece exames ao consumidor ou às empresas da região por preços inexequíveis, não considerando o custo para manter-se funcionando. Nesses casos, a estratégia de precificação assemelha-se muito à prática do dumping, que é quando uma empresa vende seus serviços por preços extraordinariamente abaixo de seu valor justo, com o intuito de ingressar em novos mercados, derrubar a concorrência, etc. Tal prática é ilegal e passível de multa administrativa.
Gestão desonesta
Em geral, para que um laboratório consiga lucrar com preços abaixo do mercado, torna-se necessário compensar nos custos administrativos. Uma das formas desonestas praticadas por empresas antiéticas ocorre com a sonegação de impostos. Sabe-se que a carga tributária é altíssima, mas não se pode usá-la de justificativa para a má condução das atividades. Além disso, para punir justamente aqueles que sonegam, dependemos de uma denúncia e de um fiscal competente.
Outra forma de uma gestão desonesta é aquela que pratica salários abaixo do piso do setor, e fora da realidade mercadológica. Se os custos para a contratação de um funcionário são altos, isso deve ser um problema do setor como um todo, e não apenas dos laboratórios que exploram, de alguma forma, a mão de obra de que dispõem.
A aquisição de insumos de origem desconhecida também contribui para a classificação de gestão desonesta. Afinal, alguns desses insumos são desviados de contratos públicos e vendidos aos laboratórios por estelionatários e a preços inferiores aos de comercialização. Não são raros os casos em que os insumos vencidos são reembalados e vendidos em um comércio paralelo.
Por fim, consideramos uma gestão desonesta aquela que prevê o comissionamento médico pela indicação do laboratório. Essa prática fere a ética tanto dos profissionais do laboratório quanto dos médicos. A recomendação médica deve ser o mais idônea possível, e sempre visando a saúde do paciente. Isso não significa que o laboratório não possa fazer divulgações esporádicas aos médicos, mostrando os benefícios do seu estabelecimento.
Despreocupação com a qualidade do estabelecimento
É uma das premissas básicas da RDC 302 normatizar a atividade laboratorial e a qualidade dos exames, para que exista a promoção, proteção e recuperação da saúde, como direito fundamental do ser humano. Apesar da necessidade de revisões do texto, que estão sendo conduzidas pelos órgãos responsáveis, o não cumprimento da RDC 302 é também considerada uma conduta antiética.
Entre os pontos que remetem a qualidade, podemos citar as condições de coleta insalubres. Isso é inclusive um dos fatores que contribui para a manutenção da atividade laboratorial; caso contrário, outros tipos de estabelecimentos poderiam ter espaços destinados à coleta e ao envio de amostras para laboratórios de apoio.
Outro grande ponto em que a qualidade é renegada ocorre quando não se realiza a aferição periódica dos equipamentos de análise. Confiar que o aparelho está corretamente calibrado e que seus resultados são fidedignos é o mesmo que colocar em risco a saúde dos pacientes que frequentam o laboratório.
Para que o setor laboratorial seja mais autossustentável, é imperativo que os proprietários de laboratório tenham sua parcela de responsabilidade no mercado, conduzindo suas atividades de forma transparente e como as regulamentações vigentes estabelecem. No entanto, isso é apenas um passo para que a valorização das análises clínicas aconteça. Abordaremos mais conteúdos relacionados ao tema desta pauta no dia 16 de maio. Para garantir que você não irá perder a continuação dessa matéria incrível, inscreva-se em nosso portal.
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